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Com ingredientes como castanha-do-pará, paçoca ganha ares gourmet

Larissa Januário

Do UOL, em São Paulo

17/07/2013 07h00

Da versão industrializada para a cozinha de restaurantes renomados, a paçoquinha não é mais a mesma.

No vácuo do brigadeiro - nem mesmo ele escapou - o docinho, tipicamente brasileiro à base de amendoim, começa a ganhar contornos gourmet nas mãos de chefs e confeiteiros. Seja integrando receitas, como pudins e bolos, ou como estrela principal em roupagens mais nobres, como no copinho para comer com colher. Como é o caso da paçoquinha preparada no novo restaurante Esquina Mocotó, comandado pelo chef Rodrigo Oliveira.

Desenvolvida por Mariana Dias, chef de confeitaria da casa, a receita ganha a castanha-do-pará no lugar do famigerado amendoim. “Antes de inaugurar, provamos diversas marcas de paçoca de amendoim, e acabamos considerando a possibilidade de testar outros frutos secos. Após muitos testes, chegamos à receita definitiva”, relata a confeiteira.

A nova paçoquinha agradou tanto a clientela, que passou a ser preparada para viagem. “Os clientes comiam o doce aqui e, depois, pediam para levar para casa. Daí, decidimos fazer uma caixinha para transportá-lo”.

Partindo da lógica da chef Mariana, o doce é tão versátil que é bem provável que paçocas com outros frutos secos surjam no mercado, como em versões à base de pistache, castanha de caju ou avelã. Será a paçoquinha o novo brigadeiro gourmet?

A primeira das paçocas para viagem

Apesar de a versão doce ser a mais popular, a origem da paçoca está atrelada à necessidade de preservar e transportar os alimentos, como carnes e peixes. “Para conservar as carnes de caça, nossos índios se valiam de um meio surpreendentemente sofisticado: o moquém”, anota o escritor Caloca Fernandes, em seu livro "Viagens Gastronômicas através do Brasil" (Ed. Senac). Nessa técnica, os nativos brasileiros secavam as carnes em fogo baixo até perderem toda a umidade, já que não tinha sal para a cura.

Difícil precisar quando a carne-seca encontrou o pilão (utensílio de origem africana usado para moer grãos e cereais) e, juntamente, com a farinha, foi esmagada até se transformar em paçoca. Mas é certo que tal alimento é um dos responsáveis pela ocupação territorial do Brasil como presença nutritiva nos farnéis (saco ou recipiente com comida para viagem) dos tropeiros que cruzaram o país. Prova disso é que o prato é consumido tanto no nordeste quanto no sul. E não mais por necessidade, mas por mero prazer.

O nome comprova a origem. Paçoca vem do tupi-guarani “passoc”, conta o chef paraibano Carlos Ribeiro, do Na Cozinha. “Nosso maior pesquisador, Luís da Câmara Cascudo, nos referenda como amassar, esmigalhar com as mãos, esfarelar, pilar”, cita o chef, cuja infância foi em torno do pilão. “Na Paraíba, Dona Walkyria, minha mãe, fritava a carne até ficar bem crocante e sequinha. Depois, batia no pilão com a farinha de mandioca fina até incorporar. Juntava um refogado de manteiga de garrafa com cebola roxa, mexia delicadamente, e salpicava com cebolinha verde para finalizar”, recorda o chef.

Hoje, o pilão deu lugar à praticidade do moderno processador de alimentos. “É bem mais rápido, mas tem sempre que tomar cuidado para a paçoca não ficar fina demais”, alerta Ribeiro. A ideia não é triturar a carne, mas incorporá-la à farinha. Segundo o cozinheiro, fica ainda mais gostoso quando a carne é assada na brasa, exatamente como faziam os indígenas.