Topo

Chef cria doce com folha de coca e prato com coração de alpaca

Rafael Mosna

Do UOL, em Madri

29/01/2014 16h47

A América Latina, ou pelo menos parte dela, invadiu o último dia, quarta (29), do madridfusión, importante evento gastronômico que acontece anualmente na capital espanhola.

  • Divulgação
  • Divulgação

    No alto, o chef Virgilio Martínez segura coração de alpaca; acima, o prato que leva o órgão apresentado no madridfusión 2014

“Trouxe uma mala com 35 kg de produtos andinos. Agradeço à aduana espanhola, pois tive sorte e tudo correu bem”, brincou em certo momento o peruano Virgilio Martínez, chef do Central, que ocupa a 50ª posição no raking dos melhores restaurantes do mundo e a 4ª entre os latino-americanos de acordo com a revista inglesa "Restaurant" .

No palco, o cozinheiro, que tem o seu país como região homenageada pelo festival neste ano, mostrou um prato que inclui chips de moraya (batata de sabor distinto e amargo) e coração de alpaca do Vale Sagrado, localidade situada nos Andes do Peru.

Inspirado nas ruas locais, o órgão foi marinado, cozido em baixa temperatura por 48 horas e depois ralado. Com ervas silvestres regionais como a "muña", o chef apresentou o resultado sobre pedras oriundas do entorno de seu restaurante.

"Uso muito da tradição para buscar essência de sabor, mas mantendo-a à margem da essência do produto em seu âmbito silvestre. Busco produtos nunca provados ou desconhecidos e vamos redescobrindo", disse o cozinheiro, que trabalha conjuntamente com um biólogo e um antropólogo, em conversa com o UOL Comidas e Bebidas.

Em vídeo, uma ilustração fazia alusão a árvores locais, como a cherimoia (cujo fruto já faz parte do cotidiano de restaurantes peruanos no Brasil), o cacau, o café e a coca. Tais plantas são o tema de uma das sobremesas centrais de seu restaurante, disse. O doce leva a fruta da cherimoia, creme de café, folha e pó de coca e ervas silvestres.

Mais tarde, foi a vez do chef-celebridade Gastón Acurio, proprietário do restaurante que desbancou Alex Atala na lista dos melhores da América Latina segundo a publicação britânica. Em um discurso messiânico e emotivo, falou sobre o movimento culinário que iniciou há 20 anos no Peru –que hoje tem "seus frutos sendo colhidos"– e sobre um projeto que estreitou relações entre pescadores artesanais e cozinheiros.

Quem botou a mão na massa foi Diego Muñoz, que está no comando da cozinha de Astrid y Gastón, principal casa de Acurio. Elaborou dois pratos, um deles feitos com "jamón" (presunto) de lagosta, uma palhinha sobre o novo menu inspirado em regiões do Peru como deserto e mar. O cardápio estará disponível a partir de 16 de fevereiro em um novo imóvel, um antigo palácio cujo processo de restauração perdurou por três anos.

Atacama no prato
“Imagino que muitos de vocês não sabem do que realmente se trata o Chile”, logo soltou Rodolfo Guzmán, do restaurante Boragó, em Santiago, o número oito na tão falada lista dos melhores da América Latina.

Pelo telão do auditório, o público viu a elaboração de uma sobremesa que tenta representar o ciclo de um ano de uma árvore no deserto do Atacama, norte do Chile. Um macaron rústico de cerca de 25 cm feito à base de planta local é golpeado no prato, dando a aparência do solo seco encontrado naquele que é um dos desertos mais áridos do mundo. Sobre essa base, um pedacinho de galho congelado de rica-rica (erva local).

*O jornalista viajou a convite da organização do madridfusión.