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Focado no ingrediente, Rafa Costa e Silva muda a cara da gastronomia no Rio

Após trabalhar nas melhores cozinhas do mundo, chef Rafa Costa e Silva abre sua primeira casa, o Lasai - Divulgação
Após trabalhar nas melhores cozinhas do mundo, chef Rafa Costa e Silva abre sua primeira casa, o Lasai Imagem: Divulgação

Roberta Malta

Do UOL, em São Paulo

21/05/2014 08h00

Ele nunca pensou em ser cozinheiro. Nascido em uma família de advogados, cursou administração com a ideia de abrir um restaurante - por conta, talvez, de seus famosos churrascos que duravam dia e noite, na casa do pai. Mas como gestor, não como chef.

Até que, nos dois últimos anos da faculdade, achou que seria importante saber o básico de cozinha para comandar seu negócio. De dia era executivo e de noite vestia a dólmã para ir à escola de gastronomia. Gostou do riscado. O mundo perdia, naquele momento, um administrador e ganhava um cozinheiro dos melhores — Rafa Costa e Silva, de 35 anos, do Lasai, no Rio de Janeiro.

Foi na CIA (The Culinary Institute of America), onde era colega de turma de Thomas Troisgros, que conheceu a americana Malena Cardiel, com quem dividiria o leito (e as contas e as dores de cabeça...) pelos próximos dez anos, e com quem divide a aventura do Lasai atualmente.

De lá, trabalhou com o moderno Jean Georges por dois anos e também no restaurante clássico Rene Pujol -antigo bistrô clássico que serviu o mesmo cardápio e nunca mudou de endereço desde 1949 até seu fechamento em 2008- até chegar ao basco Mugaritz, de Luis Andoni Aduriz, eleito o 6º melhor do mundo pela revista britânica "Restaurant". Foi ali que se encontrou completamente. Entrou como estagiário e, três anos depois, já era primeiro cozinheiro.


“Em Nova York, eu aprendi a cozinhar, produzir numa velocidade impressionante, fazer mil coisas ao mesmo tempo”, diz o chef. “Mas foi no Mugaritz que descobri como se olha para uma cenoura na geladeira”, conta.

É essa “cozinha de produto” que Rafa escolheu para chamar de sua. No Lasai, seu restaurante recém-inaugurado no Rio de Janeiro e que demorou dois anos para ser aberto, o mais importante é o ingrediente. São detalhes que se notam na cor da batata-doce (de coloração mais laranja do que esbranquiçada), na orelha de porco que ele serve sem contar do que se trata, ou no doce caseiro produzido pela mãe de Rod Werner, seu chef de bar.

Longo
São dois tipos de cardápio na casa: o “Festival”, no qual a pessoa não tem escolha (a menos que tenha restrições alimentares), e que pode variar entre 12 e 15 pratos, e o “Não me conte histórias”, onde são servidos três aperitivos, três opções de entrada, três de prato principal e mais três de sobremesa.

Cerca de três a seis pratos do menu mudam diariamente e o tempo que se passa ali dentro é longo -Lasai em Euskera (idioma do País Basco), quer dizer calmamente, tranquilamente. Mas a refeição (de cerca de três horas) passa tão rápido que o comensal sai de lá pensando no dia em que vai voltar.

Se Rafa tem mestres? Claro que sim. O primeiro, como não poderia deixar de ser, é o Andoni que, em sua opinião, tem o melhor restaurante do mundo. “É impressionante. As pessoas de lá cuidam do Mugaritz como se o restaurante fosse delas”, diz. “Se conseguir que quatro dos meus funcionários se comportem assim, já vou ser o cara mais feliz do mundo.”

Depois, vem Alex Atala, dos restaurantes D.O.M. e Dalva e Dito e do bar Riviera e também Claude Troisgros, chef do Olympe e de toda a rede CT. “O respeito que o Atala conseguiu fora do Brasil é uma das coisas mais emocionantes do mundo”, diz. “Vai ser demorar muito para outro chef brasileiro chegar nesse nível.”

Mestres e aprendizes
Alex Atala retribui o gesto. Ele conta que há cinco ou seis anos recebeu uma família carioca no D.O.M.. No final da refeição, o grupo foi à cozinha agradecer pelo jantar e contar que o menino estava indo para a Espanha, trabalhar no Mugaritz, um dos restaurantes favoritos de Atala. Dois anos mais tarde, o chef encontrou o garoto lá. “Rafa conquistou o posto mais alto, a confiança e o respeito do Andoni e de toda a equipe”, diz Atala. “Tenho certeza que ele fará o mesmo no Rio, no Brasil, na América e, quem sabe, no mundo.” Sua aposta está feita. “Meu respeito de cozinheiro para cozinheiro.”

Sobre Troisgros, Rafa se impressiona o império criado pelo pai de seu colega de faculdade, que mantém sete casas com padrão irretocável. A admiração é recíproca. “Com técnicas apuradas e muita sensibilidade, Rafa é o novo talento da gastronomia brasileira”, diz o chef francês.

E Rafa trabalha para isso. Ele se reúne regularmente com outros chefs de sua geração, como Felipe Bronze, do Oro,  Pedro de Artagão, do Irajá Gastrô e Thomas Troisgros, do Olympe (www.claudetroisgros.com.br), para fazer pesquisas, trocar informações, cozinhar e compartilhar ideias. “O Lasai poderia estar em qualquer lugar do mundo”, diz Pedro. “Mas foi fantástico ele escolher o Rio de Janeiro para a gente se unir e ajudar a levantar a cidade”, diz.

O bacana entre os jovens chefs é que eles não têm segredos, tampouco escondem produtores. Pelo contrário. “Se você for em qualquer um dos nossos restaurantes vai encontrar o mesmo atum de Recife, as vieiras de Angra, o beijupirá, os feijões. Mas tudo preparado de maneira completamente diferente”, afirma. Segundo ele, um empurra o outro para a frente e não deixa ninguém cair. No que depender deles, a gastronomia brasileira só vai crescer e o ditado que diz que “a união faz a força” vai fazer cada vez mais sentido.