Topo

Tendência gourmet, surf'n'turf mistura sabores do mar e terra num só prato

Fernanda Meneguetti

Do UOL, em São Paulo

06/04/2015 16h37

Tudo começou com a lagosta e o filé mignon servidos em um mesmo prato, em algum lugar não especificado da Costa Atlântica dos Estados Unidos. Era década de 60 e nascia o termo “surf’n’turf” – sinal de indulgência e ostentação. Com um pouco de investigação, porém, descobriu-se que juntar elementos do mar e da terra não era exatamente uma novidade, já era uma prática comum no Mediterrâneo todo. O exemplo mais conhecido talvez seja o espanhol, com a paella valenciana e suas proteínas variadas – frango, porco, mexilhões, lagostins e o que se tiver à mão para enriquecer o arroz com açafrão.

Se no filé com lagosta as duas carnes têm o mesmo peso e praticamente a mesma suculência e maciez, hoje a graça é misturar texturas: “Cubro as vieiras amanteigadas com crocante de presunto de parma, assim os sabores e as consistências se complementam”, exemplifica Gustavo Rozzino, chef do TonTon, restaurante dos Jardins, em São Paulo.

Canjiquinha de camarão - Gladstone Campos/Divulgação - Gladstone Campos/Divulgação
No Micaela a canjiquinha mineira leva linguiça e camarões
Imagem: Gladstone Campos/Divulgação
Sua receita é uma das muitas que se vê nos últimos meses em uma bateria de menus paulistanos: moluscos macios com barriga de porco pururucada, polvo com chorizo e outros embutidos de sabor defumado, camarão com linguiça e outas carnes de porco. Podem ser pratos clássicos com um twist. É o caso da Canjiquinha Mineira do restaurante Micaela. Tradicionalmente, em Minas Gerais, ela é feita com carne de frango ou de porco. O chef Fábio Vieira, por sua vez, decidiu que a carne de porco seria a linguiça e, com ela, viriam camarões. Ou seja, os sabores regionais acabam incrementados por um ingrediente inusitado.

O comensal também pode se surpreender com sanduíches ousados (de barriga de porco com lula, no Goya, ou de vieira e foie gras, no 12 Burger & Bistrot), com pratos de toques asiáticos (há Tirinhas de Carne com Molho de Ostra no Satay, Ouriço do mar com Kobe Beef no Tokyo Rose e Atum Semi-Cru com Foie Gras no Bagatelle) ou elegantemente italianos (é o caso do Tomate Assado com Carne Picada na Faca, Legumes e Aliche do Menu Zécutivo do Attimo e da Fregula com Lula, Camarão, Vieira e Presunto de Parma do Loi Ristorantino).

Fregula com Frutos do Mar - Lucas Terribili/Divulgação - Lucas Terribili/Divulgação
A massa de semolina artesanal leva polvo, vieiras e camarão, assim como presunto cru
Imagem: Lucas Terribili/Divulgação

Aprenda a combinar
Os pratos “maremonti”, como se diria em italiano, justificam-se na riqueza das texturas, na ênfase nas proteínas também, é verdade, mas mais ainda na presença simultânea de sabores delicados e intensos em um único prato. “As combinações são voluptuosas, chegam a ser sexys, e são muito comuns na Austrália”, diz o chef Greigor Casley, dono do 12 Burger & Bistrot, em Pinheiros. “Vale unir lombo de porco com ostras, filé mignon com lagostins ou vôngoli, pancetta ou foie gras com vieiras e mesmo temperar o peixe com caldo de carne”, ensina ele.

“Uma fórmula sem erro é crustáceo e carne de porco. Aí não precisa ter medo: camarão e bacon, lombo e lagostim, pancetta e lagosta. Mas vale ir além”, garante Rozzino. “A ostra pode fazer o papel da gema crua no steak tartar, o carré de cordeiro fica interessante com vôngoli, um arroz com frutos do mar fica mais denso com linguiças defumadas, um peixe rico como o robalo ganha sabor e textura na companhia de um bom paio”, complementa.

De acordo com o chef, a diferença de texturas entre o surf e o turf não é uma regra, mas uma boa brincadeira, assim como tê-los em temperaturas distintas. Acrescentar a terra ao mar é um pouco como incluir um embutido num preparo de peixe: é uma forma de conferir profundidade ao paladar. Assim como a linguiça no feijão, é uma dose de ousadia, outra de conforto.