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Sintonia gastronômica: restaurantes investem no som que embala as refeições

Não precisa levar sua playlist: casas querem conquistar paladar e ouvidos - Getty Images
Não precisa levar sua playlist: casas querem conquistar paladar e ouvidos Imagem: Getty Images

Fernanda Meneguetti

Do UOL, em São Paulo

30/07/2015 07h10

Há quem goste de "música de elevador": aquela trilha, não raro instrumental, de melodias simples que embalam desde o vaivém entre andares até a espera ao telefone ou recepção de um hotel. Embora esse tipo de composição tenha seus fãs, alguns restaurantes fazem questão de que seu som ambiente vá além.

Felipe Venancio, DJ e produtor musical badalado, tem a missão de que a música não passe despercebida: "Um bom DJ tem que ter cultura musical e saber o que está tocando. Sua pesquisa não precisa ser usada só na pista de dança", diz.

A primeira seleção gastronômica dele foi para a modelo e apresentadora Fernanda Lima, quando ela era sócia do restaurante Maní. "Ela veio à minha mesa pedir um 'help' porque não aguentava mais comprar iPods que queimavam. Além de solucionar o drama com um aplicativo, fiz uma seleção somente de novos nomes da MPB. Logo depois, vários daqueles talentos explodiram", conta.

Dieta Musical
Desde então, Venancio já fez mix de artistas influenciados pela cultura nipônica (entre eles, a banda The Cure, com "Kyoto Song") para restaurante japonês e sonorizou casas do chef Erick Jacquin, um dos jurados do popular MasterChef Brasil. "Por ele (Jacquin) ser bravo, quando o via no salão nunca perguntava se as músicas estavam 'd'accord'", diverte-se o DJ.

Hoje, ele assina a trilha do concorrido bar Sub Astor: "Um casal que toma um drinque no comecinho da noite não deve ouvir a mesma música de quem fica para a última taça. Entre um Marvin Gaye e um Tom Waits, temos uma noite inteira de diferença". O serviço fica por conta de um aplicativo atualizado mensalmente, o musicDrive, pelo qual mixagens e controle de volume acontecem como se o DJ estivesse ali.

Fernanda Duarte, proprietária do restaurante Mimo, conduzia o som da casa nos Jardins, mas resolveu apelar à experiência da DJ Mari Rossi. "É um restaurante contemporâneo, com clientes ligados em design, estilo, serviço, boa comida e música. Chegamos num caminho musical rock e folk, com raízes bem definidas, mas sem perder o frescor", conta. No acervo de 40 horas de canções, atualizado todo mês, nomes como Band of Horses, Blur, The Cure, Mumford & Sons, Neil Young, Pavement e R.E.M, entre outros. 

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Imagem: Getty Images

A casa é sua
Quem recebe amigos costuma comandar a vitrola (ou equivalente). Seguindo o mesmo princípio, Andrea Kaufmann, do AK Vila, não economiza no número de músicas de cantoras de jazz, de Ella Fitzgerald a Amy Winehouse.

Mônica Costa, do Bistrô Ó-Chá, nasceu em Angola, viveu em Lisboa, Macau e viaja muito. Sua trilha também percorre diversos cantos: "Pode ser um filme, como o francês 'Chansons d'Amour', um lugar de Portugal, que visito num fado, MPB, de que sou fã... e vou mudando, acrescentando e tirando músicas quando elas se tornam repetitivas demais". Não raro, clientes levam um pen drive com cópia da seleção.

Na Mercearia do Conde e no Condessa Café, a chef Flávia Marioto conta com a ajuda do filho Lucca: "Somos ecléticos, colocamos bossa nova, lounge, jazz, world music, música francesa e alguns mantras".Os hinos hinduístas são especialmente elogiados pela clientela e o pedido de CDs com o setlist é recorrente. Tanto que, em novembro, no aniversário da Mercearia, Flávia deve lançar um disco comemorativo.

Restaurantes típicos, por sua vez, acabam usando a música para levar o comensal à comida regional. No argentino Che Bárbaro, Martín Seoane recorre a tangos, mas sem ser caricato: "Gosto do eletrotango de bandas como Tanghetto, Bajo Fondo, Gotan Project, Mondo Tango. Naturalmente dão um ar descontraído, alegre". Juliano Valese, do espanhol Torero Valese, também vive atrás de achados do "nuevo flamenco", que combina jazz, rock, ritmos ciganos e latinos - da rumba à bossa nova.

Festa para os ouvidos
Nos seis Bagatelles do mundo, CDs com artistas americanos e franceses funcionam como cartão postal e embalam muitos "esquentas" em Nova York e St. Tropez. Em São Paulo, a casa de público elitizado e baladeiro não é diferente. Assim, em meados de agosto, o DJ residente Lucas Borchardt lança a quarta coleção brasileira: "Foquei em nosso público mais fiel, as mulheres. Daí, temos vocais femininos, instrumentos leves e um clima bem sensual, reproduzido em nomes como Bakermat, Angus & Julia Stone, Lorde e Rhye".

No dia a dia, Lucas aposta em soul e chill out (som eletrônico relaxante) até a noite, quando começa a predominar ritmos mais "nervosos", como o também eletrônico deep house. Ele também garante as playlists do Santo Pão Boulangerie, Casa do Porto e Candela. 

Consumação mínima
Entre os impostos que podem refletir no preço do seu prato, graças à trilha sonora, está o pagamento ao Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição). No próprio site da instituição é possível simular os valores. Em São Paulo, por exemplo, um restaurante de 100m² sem música ao vivo paga R$ 459,06 ao mês.