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"MasterChef" é tudo isso? Cozinha na TV divide opiniões dos profissionais

Henrique Fogaça, Ana Paula Padrão, Paola Carosella e Erick Jacquin, do programa "MasterChef Brasil" - Divulgação
Henrique Fogaça, Ana Paula Padrão, Paola Carosella e Erick Jacquin, do programa "MasterChef Brasil" Imagem: Divulgação

Fernanda Meneguetti

Colaboração para o UOL, em São Paulo

24/05/2016 08h58

É uma febre: basta ligar a TV e ali está um chef ensinando um prato, gritando com uma brigada na cozinha ou avaliando receitas de cozinheiros amadores. Ainda que shows culinários de estilo tradicional persistam, são os realities que galopam a audiência. E, apesar da ótima aceitação entre o público leigo, a opinião não é unânime entre os cozinheiros profissionais.

“Tudo na televisão é competição e isso só minimiza a gastronomia. Quem é o melhor não existe, existe o momento”, avalia Checho González. Boliviano de origem, o chef liderou o movimento de comida de rua brasileira, assim como a ocupação do Mercado de Pinheiros. “Os chefs dependem da mídia e se fragilizam. No início de carreira um programa pode te queimar, se você não tiver conteúdo para se manter”, acredita.

Antes que alguém acuse Checho de invejoso, o cozinheiro foi convidado a comandar a versão brasileira do “Kitchen Nigthmare”s (reality americano em que o chef britânico Gordon Ramsay busca salvar restaurantes à beira da falência). “Recusei. Era para esculachar, transformar a gastronomia numa caricatura. Preocupam-se só com o show e não com mostrar a cozinha, o que só alimenta os egos de uma profissão já cheia de egos”, complementa. Se Checho assiste à grade culinária atual? Não – ele não quer pegar bode de colegas. Justo, certo?

Das antigas
Bruno Stippe, da Cantina C... Que Sabe, começou na cozinha e na televisão com o pai, Roberto, nos anos 1980. “Ele era o titular de ‘O Machão e a Frigideira’, primeiro programa de homem na televisão brasileira”, conta. Discípulo da “Cozinha Maravilhosa da Ofélia”, que ficou no ar por três décadas ensinando quitutes, Bruno confessa: “Não aprovo os realities shows. Não dou palpite na vida de ninguém, mas a minha filosofia de cozinha é completamente o oposto disso. O sensacionalismo da agressão não faz sentido, é comida, é amor”.

Felipe Bronze - Tomás Rangel/Divulgação - Tomás Rangel/Divulgação
Felipe Bronze: reality shows de cozinha "são imbatíveis no quesito emoção"
Imagem: Tomás Rangel/Divulgação

Felipe Bronze, do restaurante Oro, é um veterano das telinhas que não tem problemas com os programas atualmente no ar. Conhecido do grande público pelo quadro “O Mago da Cozinha”, do dominical “Fantástico” (Globo), ele agora não vê só a comida no prato, ou no caso, na tela: "Agora analiso tecnicamente a luz, a fotografia e sigo um ávido consumidor. Os realities são imbatíveis no quesito emoção. Eles mais retratam do que estimulam a tensão, porque cozinha profissional é um ambiente altamente competitivo”, diz ele, que atualmente apresenta os shows “The Taste Brasil” e “Que Seja Doce” (ambos do GNT).

Ali no gargarejo 
Expert no assunto, o restaurateur Juscelino Pereira é discreto. Além de adorar os programas de cozinha (o “MasterChef Brasil”, da Band, é um dos favoritos), ele acompanha as transmissões para ver como se portam colegas, amigos e sócios: “É engraçado, gosto de vê-los lidando com os desafios. As tiradas do Jacquin são muito boas”. O francês foi seu consultor no extinto La Cocotte, e Carlos Bertolazzi (do “Sob Pressão” e “BBQ Brasil”, ambos do SBT) é seu sócio no Zena Café. “Ao fim das contas, é positivo - o tema traz mais apreciadores para o nosso mercado da gastronomia”.

O chef Roberto Ravioli participou do “BBQ Brasil”, mas seu coração acelerou mesmo com a edição brasileira de “MasterChef Júnior”, do qual saiu vencedor o seu sobrinho Lorenzo Ravioli. “A versão kids foi mais interessante que a de adultos e me deixou muito orgulhoso."

Chef Alex Caputo - Divulgação - Divulgação
Alex Caputo: participações em "MasterChef" e "Cozinha sob Pressão" mudou opinião sobre programas
Imagem: Divulgação

Os dois lados da balança
Mas, quanto mais íntima, mais complicada a relação com o assunto. Fã de Anthony Bourdain, Gordon Ramsay, Jamie Oliver e Nigella, o chef Alex Caputo fez parte da seleção de elenco e trabalhou na produção das primeiras edições de “MasterChef” e “Cozinha Sob Pressão”. “Quase fui um dos três jurados de ‘MasterChef’, mas acabei do lado de cá das câmeras. Desenhei toda a primeira temporada: as provas, o supermercado, a equipe de apoio... No final, tive divergências com a direção em relação aos critérios de julgamento e saí da Band”.

Na mesma época, Caputo recebeu o convite para participar da versão nacional do "Hell’s Kitchen". Além de aparecer ao lado do apresentador, o chef Bertolazzi, ele ajudava nos desafios e julgamentos dos participantes. “Foram duas temporadas. Em algumas oportunidades me inspirava na personalidade do Gordon Ramsay e fui chamado de Darth Vader por participantes”. Passadas as experiências, vieram as mudanças: “Entrei com o romantismo de quem é profissional do mercado e zela pela correção dos atos e seriedade nos julgamentos. Saí sabendo que TV é show, é business e nem tudo é como parece e deveria ser”. A saber: Alex Caputo permanece ligado na telinha, mas de forma bem mais crítica, como telespectador.