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'Carne vegana' movimenta mercado da comida e atrai dinheiro de celebridades

Carne vegana conquista pessoas ao redor do mundo - Beyond Meat
Carne vegana conquista pessoas ao redor do mundo Imagem: Beyond Meat

BBC

26/05/2019 16h15

Enquanto a empresa do Vale do Silício Impossible Foods (que significa, literalmente, comidas impossíveis) arrecadou mais de US$ 750 milhões de investidores entusiasmados com seus produtos de carne vegetal, a rival Beyond Meat (além da carne, em tradução livre) surpreendeu o mundo dos negócios quando lançou suas ações ao mercado em Wall Street, algumas semanas atrás.

As ações da Beyond Meat subiram 163% no primeiro dia de negociações, totalizando um valor de mercado de US$ 1,5 bilhão no final de abril, ante os planos agressivos de expandir suas vendas para além dos EUA, com investimento de celebridades como o ator Leonardo DiCaprio e o cofundador da Microsoft Bill Gates.

"Entendemos a composição da carne, entendemos sua arquitetura e, ano após ano, estamos diminuindo a brecha entre nosso produto e a proteína animal", afirmou Ethan Brown, fundador e diretor-executivo da Beyond Meat.

A empresa vende hambúrgueres com aparência e sabor que se aproximam da carne, mas com base vegetal, a partir de proteínas de leguminosas como ervilhas, favas e soja. Os ingredientes são submetidos a vários processos de vaporização, pressão e mudanças de temperatura para assemelhar-se à proteína animal.

Demanda por carne vegana

Os substitutos vegetais à carne ganham popularidade em alguns nichos, à medida que mais gente adota dietas vegetarianas ou veganas - seja por motivos de saúde, ambientais ou de defesa dos animais.
Em consequência, aumenta a concorrência em um mercado que pode movimentar US$ 5,8 bilhões em 2022, segundo estudo feito pela empresa de análises Grand View Research.

Só nos EUA as vendas de substitutos de carne aumentaram 42% entre março de 2016 e março de 2019, movimentando US$ 900 milhões, segundo a consultoria Nielsen. No mesmo período, a venda de carnes tradicionais subiu 1%.

Em outras economias desenvolvidas, a tendência é semelhante. No Reino Unido, por exemplo, a venda de "carnes alternativas" cresceu 18% no ano passado, enquanto a de proteína animal caiu 2%.

Uma aposta 'impossível'

Recentemente, a rede de fast food Burger King começou a vender, de modo experimental e em de seus alguns restaurantes, um hambúrguer vegetariano feito pela Impossible Foods e batizado de "Impossible Whopper".

Com a parceria, a Impossible Foods busca massificar um produto que até agora vem sendo de nicho, mas que começa a expandir suas fronteiras a partir de investimentos de celebridades como Serena Williams, Katy Perry e Jay-Z.
Os hambúrgueres da empresa são elaborados a partir de uma levedura geneticamente modificada que produz o ingrediente-chave: a molécula heme, que dá o aspecto suculento e a aparência de conter sangue à carne vegetal, durante seu cozimento. Também compõem o hambúrguer proteínas de trigo, soja e batata.

A Impossible Foods é vendida atualmente em mais de 7.000 restaurantes ao redor do mundo e planeja lançar seus produtos em supermercados americanos na segunda metade deste ano.

Outros grandes investidores por trás do projeto são (também) Bill Gates e os fundos Khosla Ventures, Google Ventures, Horizons Ventures e Open Philanthropy Project.

'Para além da carne'

Este é um mercado já explorado pela Beyond Meat, que se especializou na venda de hambúrgueres, salsichas e outros substitutos da carne em supermercados.

Como pesquisas indicam que cerca de 5% da população americana seja vegetariana, um dos desafios é competir diretamente no mercado dos que comem carne, mas estão abertos às alternativas - os chamados "flexitarians" (ou flexitarianos). Daí o esforço para que a carne vegetal se assemelhe em textura, cor e sabor à carne animal.

A Beyond Meat diz planejar aumentar a variedade de produtos, inclusive substitutos a carne de porco e frango feitos a partir de aminoácidos, lipídios e minerais. A empresa tem 28 mil pontos de venda, a maior parte deles nos EUA, embora já tenha alguma entrada nos mercados canadense e europeu.

Luta de gigantes e o perigo do efeito bolha

Tamanha é a animação de investidores com o mercado de carne vegetal que empresas como Tyson Foods, maior processadora de carnes dos EUA, também planeja sua própria versão de produtos elaborados com base em proteína vegetal nos próximos meses.

O McDonald's já vende hambúrgueres veganos em países como Alemanha e Suécia. A carne vegana é distinta da carne sintética, que é produzida em laboratório pelo cultivo de células-tronco animais e que ainda não está disponível para consumidores.

Dito isso, esse é outro produto que, em breve, pode entrar na disputa pelo mercado. Um exemplo é a empresa Just, que planeja colocar à venda nos EUA sua carne sintética de frango ainda em 2019.

No entanto, alguns especialistas temem que esteja se formando uma bolha - quando vários concorrentes entram no mercado ao mesmo tempo, sem que a demanda de conta de tanta oferta - e lembram que a Beyond Meat, por exemplo, ainda não dá lucro (e não há previsão de quando isso vá acontecer).

A empresa, por sua vez, afirma que os balanços deficitários se devem a investimentos em "inovação e crescimento".
Ao mesmo tempo, a Associação de Criadores de Gado dos EUA defende que a palavra "carne" só possa ser usada em produtos que contêm "tecido de carne de animais que tenham sido abatidos de modo tradicional".

Na União Europeia, também existe pressão de produtores tradicionais para restringir o uso de palavras como "hambúrguer" e "salsicha" para produtos de origem exclusivamente animal.

A França, por exemplo, tem regras rígidas para rótulos de produtos vegetarianos: em maio do ano passado, o país aprovou medida que proíbe uso de nomes como "filé vegetariano" e "salsicha de soja" para descrever produtos sem carne, alegando que esses termos confundem os consumidores e os fazem acreditar que sejam feitos de proteína animal. A medida gerou críticas de alguns setores.

O modo como esses e outros conflitos se resolverão vão impactar a velocidade de crescimento de um mercado que até agora aparece como uma nova promessa da indústria alimentícia.