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Já ouviu falar em vinho laranja? Descubra a bebida coringa da harmonização

Luciana Mastrorosa

Colaboração para o UOL, em São Paulo

13/11/2015 07h00

Você conhece o vinho laranja? Ele é tendência no exterior, mas ainda é um ilustre desconhecido para a maioria dos apreciadores de vinhos no Brasil. “Tecnicamente, o laranja é um vinho branco de maceração prolongada, feita com o uso não só do suco da uva, mas também de suas cascas, como ocorre com os tintos”, diz a chef Lis Cereja, da Enoteca Saint Vin Saint, em São Paulo.

Por conta dessa particularidade, o vinho laranja combina a estrutura dos tintos e a acidez marcante dos brancos, o que faz dele um par perfeito para uma miríade de pratos, de carnes de caça a pescados e queijos. Dependendo do tempo de contato com as cascas das uvas, sua coloração fica mais clara ou mais escura, com tons que variam entre palha, dourado, alaranjado, ocre e âmbar.

A Enoteca Saint Vin Saint é um dos poucos locais a privilegiar os laranjas, com uma carta exclusiva só para eles. São garrafas provenientes dos principais produtores mundiais dessa variedade, como Itália e Eslovênia – com alguns brasileiros no meio. “Muitos vinhateiros estão apostando nesse estilo no Sul do país”, afirma Lis.

Naturalmente
Por ser adepta dos vinhos naturais, orgânicos e biodinâmicos – produzidos com um mínimo (ou nenhum) acréscimo de substâncias químicas, como conservantes – a chef encantou-se ao ouvir falar desse tipo de vinho, cuja produção privilegia o resgate de técnicas ancestrais.

A tendência começou com o italiano Josko Gravner, considerado o “papa” do vinho laranja. Sua fazenda fica em Collio, na região do Friuli-Venezia Giulia, fronteiriça com a Eslovênia – daí o motivo de alguns dos principais vinhos laranjas virem também desse país. Nutrindo um interesse cada vez maior por antigos métodos de produção vinícola, Gravner, no final da década de 1990, começou a apostar em técnicas como o uso de ânforas de barro e a maceração de uvas brancas com suas cascas.

“Esse método de produção é milenar. O costume atual de vinificar o branco só com o mosto, sem as cascas, é bem recente - presume-se que tenha uns 150 anos”, lembra Gilberto Medeiros, presidente da Sbav – Associação Brasileira dos Amigos do Vinho. “O laranja é o ancestral do vinho branco”.


As importadoras Piovino e Decanter, em São Paulo, são das poucas a apostar nesse tipo de vinho. Por ser elaborado de maneira mais artesanal, a produção é menor, o que os encarece. Embora seja possível encontrar bons vinhos laranjas a partir da faixa de R$ 90, como o italiano Catavela (R$ 97, na loja virtual da Piovino), a exclusividade tem um preço: dependendo do produtor, os rótulos desse estilo podem passar dos R$ 600. “São vinhos bastante especiais, que ficam meses em contato com as cascas e depois levam anos maturando”, diz Leandro Mattiuz, sommelier da Decanter.

Vinho coringa
Em termos sensoriais, os especialistas concordam em uníssono que os laranjas são algo bastante notável. “São ricos em perfil aromático, pois transitam entre o tinto e o branco. Sentem-se os taninos na boca, há mais corpo e mais estrutura, com muitas notas de frutas secas, ervas, amêndoas e um fundo mineral”, completa o sommelier. Carolina Escobar, sommelière e proprietária da loja virtual Winebio, destaca ainda as notas oxidativas presentes nos laranjas. “Não há aquele frescor no aroma, à primeira vista parece que o vinho está oxidado. Mas ao prová-lo, nota-se uma acidez muito agradável na boca, além de uma estrutura interessante”.

Graças a essas características, a harmonização possível atinge um amplo espectro. “Se eu tivesse de escolher um vinho coringa, seria o laranja”, afirma Leandro. O sommelier aponta que as carnes que ficam entre as brancas e as vermelhas são perfeitas para acompanhar esse estilo de vinho, como porco, codorna, bacalhau, galinha d’angola, javali. Lis Cereja concorda com a versatilidade desse estilo: adora combinar os laranjas com tipos variados de queijo. “São vinhos muito complexos. Têm acidez, tanino, aromas. A maceração com as cascas é que traz essa complexidade”, lembra a chef.